quarta-feira, 28 de junho de 2023

Check List

 Perceber-se em sua totalidade: 

  • Mensurar o caminho que percorreu.
  • Celebrar e dar crédito por suas vitórias.
  • Reconhecer os que estiveram por perto.
  • Acolher ajuda.
  • Aceitar suas imperfeições.
  • Reverenciar sua beleza.
  • Conviver com os desafios diários.
  • Prezar por sua paz (que foi conquistada à muita luta).
  • Ponderar o que vale seu tempo.
  • Respeitar seus limites.
  • Pactuar com o que te faz crescer.
  • Declinar o que te limita.
  • Identificar sua dimensão.
  • Desaprovar o que esteja abaixo dela.

E este é o check-list para jamais diminuir-se para caber no mundo de alguém. 








domingo, 9 de abril de 2023

Retorno

 Desde 2014 sem registros por aqui, sem imaginar que meus devaneios ainda estariam no ar, me deparo com esta cápsula do tempo que me trouxe tantas lembranças, doces e amargas, ao passo que li as antigas anotações. 

Neste momento paro para pensar sobre quantas vidas vivi nestes nove anos de hiato: a Natália de hoje não é tão diferente da de ontem, mas carrega uma bagagem bem maior. 

Este espaço já foi minha terapia, mas depois que segui o tão necessário hype da vida adulta de minha geração, o de encontrar-me periodicamente com meus medos e angústias, ansiedades e desconfortos mediado profissionalmente, não mais vim vociferar, mesmo que poeticamente, o que havia guardado em mim, apesar de reconhecer que estes registros teriam grande valia no constante processo terapêutico. Pois bem, eis que retorno, após um gatilho vindo de um date excelente. 

Eis que me proponho a voltar com esses escritos, criar uma memória de mim e minha trajetória, quiçá para ler e observar os caminhos por onde passei ou para que os vierem depois de mim, se vierem, saibam o que guardei no coração sem que muitas vezes conseguisse externar. Pois sim, a Natália de hoje ainda tem dificuldade de falar do que inquieta, e ao menor sinal de borboletas no estômago, toma um antiácido de realidade para aliviar a ânsia (mais uma questão para levar à terapeuta).

Junto com a proposta deste exercício de escrita, me lanço também ao de fazer uma retrospectiva dos caminhos que trouxeram até aqui. 

Mas Natália, aqui onde? 

Parafraseando Gil, aqui e agora, é o melhor lugar do mundo, até agora. E espero que continue sendo, mesmo se eu mudar de lugar. 

A Natália de 2023 tem 37 anos, com vitalidade digna de uma década atrás (até mais), cuida do físico e da alimentação, hoje não mais pelo apelo estético, mas de fato pela saúde e pela visão de que apesar de conservar a vitalidade e energia, meu corpo não é mais tão jovem e necessita de um cuidado a longo prazo para percorrer a outra metade da vida, dentro de tantas vidas que viverei nesta existência, é uma questão de sobrevivência para não apenas sobreviver, mas saborear plenamente as experiências que estão por vir. 

Estabelecer uma rotina de treinos, para quem não tem uma rotina definida é um desafio, mas esta pode ser também apenas mais uma desculpa de quem não gosta de academia, como eu, e acaba não tendo o compromisso com esta atividade (encarada como uma responsabilidade comigo e para com meu corpo), e acaba se perdoando e relevando todas as ausências.  Todavia descobri gosto de estar em movimento,  e dentro desta descoberta estou em busca de algo que faça meu corpo e mente vibrarem juntos: esta é uma meta clara, experimentar, tentar, até encontrar. Yoga, dança, natação, luta?! São muitas possibilidades, e eu espero que a Natália do amanhã já saiba qual, ou que pelo menos esteja experimentando, pois é sinal que está com o corpo em movimento. 

E falando em corpo, eu olho para a Natália de ontem, tão insatisfeita e insegura com o que tinha, e vejo com orgulho a de hoje, que não tem mais tanto colágeno e firmeza, com medidas maiores, mas muito satisfeita e feliz com o que vê no espelho: é uma questão de olhar pra si com afeto. 

O auto cuidado, a auto aceitação proporcionam uma qualidade de vida imensa. A noção do corpo que habito me permite alcançar a liberdade de mostrá-lo, em seu todo e principalmente partes que sempre dava um jeito de esconder, não por achar indecência, mas por vergonha. Totalmente segura?! Não, mas ciente de que inseguranças não precisam me limitar.

A Natália que aqui fala tem sonhos mais concretos, sonha dentro do alcance, tem espectativas mais simples e trabalha, aceita e vive os processos para realizar. Diferente da que fui um dia, prostrada, imóvel, aguardando quem me leve pela mão para voar. Pés firmes no chão, tentando manter a cabeça no lugar. Hoje não penso mais no tempo que perdi neste hiato, vejo como um canto o qual não quero retornar. Saí da inércia em um ato de coragem de mudar de área de atuação profissional, pois a Natália de outrora achava que aos 27 anos era tarde para mudar os planos: Ainda bem que a de hoje já sabe que tarde é o depois.  De 2014 para cá foram 2 cursos superiores concluídos, uma pós graduação e um mestrado em curso, daqui para frente ainda tenho mais para querer, e isso tem muito a mais a ver com trajetória do que incremento ao Lattes, é uma questão de permanecer em movimento. 

Esta versão de mim, que mora sozinha desde 2021, saiu da casa dos pais direto para viver o grande amor, arrebatador, intenso, rápido,  tão rápido que nem deu tempo de perceber o que não era: capaz de existir fora dos bons momentos. Foram dias felizes, até a felicidade durar, até a primavera de 2019, até eu ser acometida por uma grave doença, uma rara síndrome, chamada DRESS, que me rendeu uma estadia de 29 intermináveis dias no hospital. Ao passar do tempo a presença daquele que estava sempre ao meu lado se tornava cada vez mais escassa, cuja ausência era justificada pelo cansaço de estar se desdobrando entre trabalho e minhas demandas de cuidados, até o dia que simplesmente se fez totalmente ausente, viajou por dez dias, saiu de férias para seu sonho infantil recorrente. O dia que obtive a alta hospitalar, que dia feliz, chorei de alegria ao ver que tinha sobrevivido. Eu estava destruída de todas as formas, irreconhecível, as alterações físicas que sofri pela doença e pelo tratamento foram brutais, mas eu estava viva, e percebendo o quanto amo a vida. Eu não tinha para onde voltar, o abraço que me cuidaria era só para os tempos de saúde, na doença fui acolhida pela minha família. Voltei para casa, a própria filha pródiga, emocionalmente e financeiramente destruída. Trabalhei, estudei, juntei cacos, refiz laços, me reergui e haja terapia! Um ano, em meio a pandemia e o tratamento continuado da síndrome, minha pele sarou, minhas unhas e cabelos voltaram a crescer, cada medicamento que eu descontinuava o uso era uma celebração, 2020 foi o ano da regeneração, para que no ano seguinte eu pudesse enfim sair do ninho, em direção a um vôo solo, que não tem sido nada solitário, família e amigos, poucos e especiais, estiveram presentes e são meus presentes diários. 

A experiência de morar só tem sido maravilhosa, plena, libertadora. Tenho me descoberto uma pessoa que gosta de ficar em casa, no meu silêncio mas sempre com uma trilha sonora ao fundo. Cresci e vivi até a vida adulta em uma casa onde as pessoas sempre gritaram e reclamaram muito, e isso só aumentou meu apreço pelo sossego. É muito bacana a vida com minhas coisinhas, plantinhas e a gatinha Biela. Todos os dias tenho meu ritual matinal: chamego da gatinha, alongamento e mobilidade,  checagem das plantinhas, café da manhã com calma ouvindo algum podcast. Acordo cedo para o dia começar suave. Muito diferente do tempo em que morava com meus pais, que o dia iniciava em meio de muita zoada e reclamações por absolutamente vários nadas e ao mesmo tempo tudo. Cada boleto que se repete mês a mês vale a minha paz. 

O breve período que voltei a morar com minha família foi extremamente desgastante, sou muito grata por terem aberto as portas para mim no momento em que mais precisei, mas apesar de não ser nenhuma maníaca por organização,  o caos e as tendências acumuladoras de lá me sugava as energias, as tentativas de organizar o ambiente eram como enxugar gelo.  Me recordo de levar várias vezes essa questão à terapia, até que minha terapeuta questionou: mas de quem é a casa? Aí o gatilho veio, para ter minhas regras, preciso estar no meu espaço. Hoje o gasto de energia nas tarefas habituais até me dão um certo prazer, menos lavar louça, pois um dos poucos ônus que encontrei de morar só é não ter com quem negociar a feitoria da comida com a lavagem das louças.

Distante o bastante para ter privacidade e paz, perto o suficiente pra dar e receber o suporte necessário. Agora em casas diferentes mas no mesmo bairro: dois quilômetros de distância bastou para melhorar em léguas a minha relação com a família. 

Neste retorno celebro o estar e ser de mim, mas foi curioso ver nos textos antigos como eu centrava minhas questões aos relacionamentos afetivos, e bom perceber que não é mais assim. Dando mais espaço para mim, a ponto de ter dificuldade de deixar alguém entrar no meu ecossistema existencial, coisa que reconheço poder vir da bagagem de traumas que levo comigo, que inclusive, nesta quase uma década, foram vários acumulados, retroalimentando minha memória de sinais de advertência antes de entrar em uma relação, mas vejo isso com um olhar muito mais de cuidado, do que medo. Não temo me relacionar diante de reciprocidade. 

Redirecionar os afetos para as outras relações, as de amizade e familiares, também me trouxeram mais completude, a gente é ensinada a ver o amor, concentrar o amor, nas expectativas românticas e acaba deixando passar, deixando de viver os outros grandes amores. E eu ainda não vivi o grande amor que quero viver, o materno. Estava na espera do companheiro perfeito para realizar, e mais uma vez me vi  aguardando um agente externo para agir por mim, todavia, esse desejo de maternar não é de necessariamente gestar (nesse momento me vem a lembrança um livro que li chamado "filho de mil homens" de Valter Hugo Mae, que fala de afetos e das mil formas que eles podem surgir, das inúmeras facetas que tem o amor). Eu gosto de amar, espero saber. Não é algo que urge, mas é uma vontade que existe, logo, acho importante considerar isto em meus planos. 

Íntima e próxima de Deus, no momento em que estou totalmente afastada e pragmática em relação a qualquer instituição religiosa,  O vejo em mim e na natureza. Acredito em uma força maior que impulsionou minha trajetória, minha sobrevivência,  minha vontade de permanecer boa em meio de tanto impulso não ser, mas com o pragmatismo me ajudando a entender que não depende exclusivamente dessas forças astrais do universo o caminho a trilhar: Depende de mim.